21 de setembro de 2011

A cor das coisas

Abriu então a caixinha miraculosa. De lá resplandecera uma luz em tons múltiplos que imitavam os reflexos infantis dos cristais.

Ela olhou com graça as preciosidades que ali estavam guardadas e escolheu uma daquelas coisinhas pequeninas da cor rosa, a qual durante algum tempo olhou com olhos de curiosidade e admiração, até que por um impulso, ela a guardou novamente. Repetiu o ato inúmeras vezes, cada vez retirando uma pecinha de cor diferente, uma mais preciosa que a outra, uma mais reluzente que a outra. Elas eram a representação da perfeição.


Foi quando de forma quase que desastrosa um homem lhe esbarrou. A moça jogou as mãos para o alto e a preciosa caixinha de coisas voou. Quanta tristeza! O homem ficou inconsolável ao ver toda aquela riqueza espalhada pelo chão da cidade cinza. A moça tentou consolá-lo, tentando mostrar-lhe que toda aquela riqueza só faria sentido se todos que tivessem tristes também pudessem a ver. Falou-lhe que o escuro da caixinha só apagava a boniteza delas.

E então, o homem questionou o porquê a moça guardava com tanto esmero aquelas coisinhas na caixa. E então, ela o respondeu que estava esperando juntar a última pecinha daquela coleção para espalhá-las pela cidade afora, mas como elas, que têm vontade própria,  quiseram pairar por aí afora antes, ela estava igualmente alegre, pois a vontade delas havia sido concretizada.

A partir daquele dia, o pobre homem cinza também se apaixonou pela cor das coisas e passou a pulverizá-las por todos os cantos que passava. E as pecinhas, ganharam o mundo afora para alegrar almas. Conta-se, que por muitas vezes e por muitos anos pessoas erradas as aprisionaram em caixinhas, tentado sorver aquela riqueza, mas sempre, sempre elas ganharam novamente o mundo para voar.

24 de maio de 2011

piuzices para Mariana.

Quando ela olha, é bom prestar atenção.


Me ensinou que passarinho de metrópole é o alarme de um carro,
e que borboleta de metrópole é papel que voa na imensidão

Quando ela ama, é bom prestar atenção.

O céu fica feito pintura, e deus aparece com delicadas mãos
vivo com o olhar erguido, a espera de carícias, desde então.

Quando ela voa, é bom prestar atenção.

Dribla o ar, ganha uma casa maior que todas as outras,
abre-se por completo, o mundo em oposição, o pulsar do coração...

Quando ela fala, é bom prestar atenção.

Voz serena, compilada por singelos toques da natureza,
a junção de todas as partes, unas, faz brotar sua beleza
na imensidade azul, então.


Mariana, possui o dom da palavra que encanta
A menina que me ensinou a virar planta, e criou raízes no meu coração.


Precioso presente de aniversário, por Natame Diniz

22 de março de 2011

Manhã de outono - O despertar


qual será a sensação do primeiro bater de asas?
o coração a pulsar a dualidade iminente no peito, confrontando as ideias do abrir-se por completo para o mundo em oposição ao beijo mortal da Terra.
a sublime alegria de superar o conforto e amor quente do ninho, para ganhar uma casa muito maior. o mundo. o tudo. os céus!
amanhecer em uma encosta ao meio do oceano e em tempo tão breve deslizar pelos campos dourados  de minha Terra África. voar pelos confins afora tendo como meta a fome. o frio. a liberdade.
fazer acrobacias, driblar o ar, pousar na árvore acolhedora, que ainda é ninho para aqueles pequeninos, mas tornar a voar. voar até dissolver-se com o ar.



11 de fevereiro de 2011

Ainda na cidade...

Passarinho de metrópole é o alarme de um carro.



8 de fevereiro de 2011

é na pureza das flores e do amor que reside a essência da vida.

2 de fevereiro de 2011

nota sobre a tristeza

triste não é dia de velório
mas é o enterro diário de si mesmo,
pois a vida está a soterrar-nos.


tristeza não tem nada a ver com fatos
mas sim com estados,
e no meu caso,
seria um estado permanente da alma.



17 de janeiro de 2011

Na cidade grande...





borboleta de cidade grande é um papel que voa.





14 de janeiro de 2011

A Lenda do Peixe Bororo

Conta a história que um pequenino vilarejo de pescadores sofreu durante alguns séculos a maior escassez de peixes de todos os tempos. Durante aquele período não se via nadar nenhum ser no mar, pois todos os animais haviam sumido misteriosamente. De todas as espécies apenas uma restou.

Os pescadores tentavam compreender como tantos animais haviam sumido da noite para o dia, e mais, preocupavam-se com o que comeriam a partir daquele momento, já que os peixes, que eram a principal fonte de alimentação na vila, haviam desaparecido.

Durante a noite que os peixes se foram, somente um cardume permaneceu na ilha, o cardume dos peixes Bororo, que eram considerados sagrados pelos pescadores. Eles acreditavam, que esses peixes eram responsáveis pelo equilíbrio da vida no mar e na Terra, mantendo assim, a harmonia entre o animal-alimento e o animal-predador. Entre o homem e os seres do mar.

Para os pescadores o Bororo não poderia ser comido nunca, pois cada peixe concentrava em seu cerne, metade de vida animal e outra metade de espírito. Caso alguém se alimentasse deste animal sem estar preparado, entraria em um estado de coma, onde a alma escaparia fluidamente, como a fumaça que esmaece pelo vão de uma garrafa.

Os dias passavam e o alimento diminuía a cada dia. Temendo não ter mais o que comer, as pessoas se apavoravam e aos poucos abandonavam a ilha, pois já não acreditavam mais no retorno dos peixes. Deixavam suas casas, abdicavam a si da própria vida. Foi então que o pescador mais antigo da vila tomou uma importante decisão, pescar o peixe sagrado.

O sábio pescador mesmo sabendo dos riscos que correria em comer o peixe sagrado, lançou-se ao mar em busca desse animal. Ao perceberem, os outros moradores tentaram contê-lo, pois temiam as conseqüências irreversíveis dessa escolha, mas calaram-se ao perceberem que o velho homem já havia decidido o seu futuro.

Ao sair pediu proteção aos céus e lançou-se ao mar. Percorreu com o seu velho barco de madeira por dias afora o oceano infinito, até por fim, conseguir avistar o cardume sagrado. Permaneceu imóvel durante algum tempo observando a beleza e a incomum sincronia daqueles seres. Munido de coragem, empunhou o seu arpão e levantou os braços, como quem recebe bênçãos e, já na posição de lançar aquela arma mortal, olhou com firmeza aqueles peixes que nadavam lentamente, como que permitindo-se ser presa, e pediu sabedoria para compreender o que lhe seria evidenciado.

Lançou-se à vida.

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Como uma pancada nas têmporas, a consciência foi tornando-se torpe e a negridão do infinito tomou-lhe por completo.

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Despertou. Ele, o peixe e o arpão, todos deitados sob a madeira úmida daquela pequena embarcação. Sentia-se iniciado, pronto para a comunhão entre matéria e espírito.

Certo de sua missão, o pescador retornou à ilha com o seu barco, o peixe e o arpão. Preparou calmamente um fogareiro brando e estável, limpou o peixe e agradeceu a criatura por ter renunciado à vida para alimentá-lo. Pousou o animal cuidadosamente sobre a brasa.

Enquanto o peixe era preparado, sentou-se e pôs-se a observar o mar. Seu pensamento correu fluido e em um tempo fora do tempo. Deixou abandonar-se até sentir-se pronto.

Ingeriu aquele pedaço de vida.
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Temeu por instantes não suportar o porvir, mas conteve o pensamento e retomou o processo de contemplação.

Lentamente os seus pés e mãos mergulharam imensidão a dentro, e ele, o pescador, já não os sentia mais, era como a sensação de quem afunda os dedos pela saca de arroz. Seu corpo todo inebriado por aquela sensação, emanou um calor que exalava do centro da vida. Então, amou com intensidade. Vivenciou naquele momento o retorno ao útero da vida e sentenciou:

“O amor é o único alimento do corpo e da alma”.



1 de novembro de 2010

27 de outubro de 2010

Garota Planta



Por medo de sonhar em demasia, ela, a garota, optou por apenas viver nos ventos sublimes e azuis dos encantamentos oníricos. Fez o seu medo, o seu porvir ainda mais belo.

Renunciou à falsa vida e planta tornou-se. Passou a ter aorta de galhinhos esverdeados que conduziam uma seiva tão alva quanto as penas daquelas gaivotas do Sul. Dos galhinhos saem também incontáveis folhinhas que na primavera floram e eclodem frutinhas, as quais, minúsculos passarinhos devoram com todo o seu amor de fantasia.

E ela, a garota, também passou a se alimentar de si mesma, e assim, notou que a felicidade serena passou a ser a sua única realidade. E então amou. Amou com verdade a sua existência e também a de todos os seres que a faziam intensamente viva.
 
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