16 de agosto de 2009

sertão. sol. letra. telha. amor e barro.

dia 27 de maio de 1984, ela avistara pela primeira vez o seu futuro esposo. tinha apenas 7 anos, mas já sabia que aquele seria seu único e grande amor para toda a vida. passou todos os dias que viriam a frente até o dia de seu casamento a bordar, escrever e esperar o seu véio.


escrever poemas e histórias sobre o seu futuro amor era a sua atividade diária mais esperada, e assim foi até o dia de seu casamento. passava horas a imaginar como seria sua vida de casada, os seus filhos, netos e bisnetos, depois transcrevia todas as suas emoções e certezas para algum papel que encontrasse. guardava todas as suas anotações feitas com esmero e paciência em uma caixinha de madeira no fundo de seu armário e ficava a pensar nelas como se fossem uma recordação de algo que ainda nem acontecera.


casou-se aos 16 anos, ele tinha pouco mais. moraram durante um curto período numa casinha simples emprestada pelo pai do noivo, enquanto construíam a mais bonita casa que a cidade viria a ter.durante os dias, ele subia as paredes da casinha com os tijolos que sua véia fazia. aplicava todo o seu cuidado colocando tijolo a tijolo, e pensava estar pondo pequenas partes de si mesmo naquele abrigo do amor. a cada metro levantado sentia mais orgulho do que fizera, e então, continuava o seu trabalho mais empenhado e feliz.


durante a noite, após a higiene, ela acendia a lamparina na varanda da casa e lia novamente um poema por noite para relembrar dos sentimentos que jamais esquecera. logo ao amanhecer, quando iniciava os seu trabalho, carregava junto a si alguns dos antigos escritos presos nas ancas e caminhava durante horas para ir a beira do riacho colher barro para fazer as telhas e os tijolos da sua futura casa. voltava com as latas de barro, colocava-o na forma para fazer a matéria prima de seu abrigo. fazia nada mais que amor.


quando o barro ainda molhado, transcrevia suas cartas para as telhas e tijolos, como quem inscreve toda sua história e das suas futuras gerações para todo o mundo ver e aprender com o verdadeiro sentimento de pureza. fazia desenhos e escrevia, pintava e completava as telhas com todo empenho e fidelidade. sabia estar escrevendo o passado o presente e o futuro, todos os tempos de forma imutável.


a casa ficara pronta meses depois. os sentimentos de calor humano transpassados para o telhado e paredes da morada eram intensificados pela energia solar. no corpo ela já se faz latente, mas quando permite-se que ela entre em contato com o espiritual, torna-se evidente e pulsante. Mais bela que qualquer compreensão humana.
 
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